Estes dias ouvi uma pergunta que era: “Qual é a primeira memória que tens de ti própria?”
Quando ouvi a pergunta até achei meio descabida, quer dizer, lembro-me de mim desde sempre. Mas depois percebi qual era o verdadeiro significado. Qual é o primeiro momento em que tenho consciência de que existo. Pois bem, por mais óbvio que parecesse a resposta, não foi fácil descobri-la.
A primeira memória que tenho de mim própria é de ser muito pequenina, no berço e ouvir a minha mãe dizer que todos tinham que falar baixinho porque a menina estava a dormir. Ora, a menina era eu.
Mal sabia esta menina pequenina as provações que teria que passar para ser tornar na pessoa que é hoje.
A minha infância não foi fácil. Quando era criança achava que tudo o que acontece na minha família era normal, ou seja, que todas as famílias eram como a minha. Depois percebi que quando estava em contacto com os meus primos, amigos e respetivos pais não era bem assim. Talvez o momento mais duro de todo este processo foi quando me caiu a ficha de que o que se passa em minha casa não é normal. É como se a vida me tivesse enganado mesmo à frente dos meus olhos.
A minha mãe tem uma doença crónica chamada de bipolaridade. Associado a isso tem um sistema nervoso alteradíssimo. Tenho 26 anos e hoje é o dia que não consigo lidar com esta situação. É muito difícil conviver com uma pessoa assim. Qualquer que seja o meu comportamento nunca sei como a outra pessoa vai reagir. É intrínseco ao ser humano proteger-se de situações que o magoam. Por isso o meu mecanismo de defesa foi começar a desligar-me da minha mãe. Quanto mais ligados somos a uma pessoa mais nos dói quando nos ferem emocionalmente, por isso eu desvinculei-me dessa ligação.
Entretanto cresci, até que cheguei à fase da adolescência. É realmente a fase da estupidez, mas também a fase em que começo a ter ainda mais consciência de como sou e de como quero ser. Sou capaz de dizer que é nesta fase que tenho que tomar as decisões mais difíceis. Nomeadamente qual o rumo profissional que quero seguir. E nesses momentos é claro que queremos ter alguém que nos apoie, um refúgio. Felizmente o meu pai assumiu esse papel e sempre me orientou de qual é o caminho que teria que seguir. Seguiu-se a faculdade.
A FACULDADE. Primeiro não entrei no curso que quis nem na cidade que pretendia. Para mim foi como se estivesse perdida e com muito medo do que aí vinha. Era um grande obstáculo na minha mente ter que ir para Coimbra e ficar lá sozinha sem conhecer ninguém. Tinha muito medo e sentia-me imensamente insegura com o futuro. Pois hoje é o dia em que reconheço que esse grande obstáculo foi das melhores fases da minha vida. Aprendi a ser independente, responsável comigo própria e desenrascada. O meu medo inicial teve que ser superado pela coragem de que eu não estava bem e o que vinha a seguir só poderia ser melhor. E foi. Moldei totalmente a minha personalidade para aquilo que não conseguia ser quando estava em casa dos meus pais. Isso foi tão bom. E ter que voltar a casa deles não foi e continua a não ser fácil.
O passo seguinte a terminar a faculdade foi arranjar emprego. Consegui logo empregar-me na minha área, no entanto, o que parecia um mar de rosas foi mais uma vez uma descoberta. Não me identificava nada com aquilo que estava a fazer. Por outro lado, o quão ingrata eu era por ter o privilégio de estar a trabalhar na minha área e não gostar? Pois bem, não fui ingrata nenhuma. Descobri-me ainda mais. Sobrevivi nesse emprego durante 1 ano e meio, depois voluntariamente pus um ponto final, sem plano B. Um mês depois estava a trabalhar, é certo que não na minha área mas com uma paz de espírito incrível. Aquilo que parecia um falhanço na minha vida foi uma descoberta daquilo que realmente quero fazer da minha vida. Eu é que decido se sobrevivo, ou se vivo.
No meio de todo este percurso entre o fim da faculdade e o início do primeiro emprego comecei a namorar e agora vamos casar.
Estou mais uma vez numa fase de profunda insegurança. Tenho a certeza que é com ele que quero casar, mas tenho medo do que está para vir. Tenho medo de ter um casamento igual ao dos meus pais, tenho medo desistir de procurar a felicidade, tenho medo da mãe que serei. Tenho medo da mudança.
No entanto, não posso deixar de referir que há alguém que nunca abandonei nem me abandonou neste processo todo. Sou uma pessoa de fé. Deus. Ele sempre me “pegou ao colo” quando eu mais precisei. Tenho a certeza que ele sempre esteve ao meu lado, mesmo quando eu ficava chateada com ele ter uma família destruturada.
Sem dúvida que ficarei sempre com marcas emocionais que se as souber usar me vão ajudar a superar-me.
O que me alenta neste momento é saber que sempre que passei por este processo de insegurança o que veio a seguir foi melhor do que o que eu imaginei.
Quero aprender a acalmar o meu coração e a acreditar sempre, que o melhor está para vir.