Era dia 24 de Dezembro, estava de férias, finalmente!
Já tinha passado mais de um ano depois das minhas últimas férias, o ano tinha sido um caos, trabalhava muitas horas, estudava e ainda escrevia uma tese académica. A loucura total, não havia tempo para descanso, para relaxar nem para tirar férias.
Depois da azáfama de escrever uma tese, decidi tirar uns dias de férias antes do Natal.
Estava tudo a correr bem, até ao dia 24 de Dezembro em que acordei e estava cega do olho direito.
Tal nunca me tinha acontecido e a primeira reação foi: entrou alguma coisa para o olho e estou a fazer alguma reação.
Lavei os olhos, estava muito desconfortável, mas sinceramente naquele dia não dei muita importância ao sucedido, havia muitas coisas para preparar para a grande noite de Natal.
No dia seguinte estava igual, no dia posterior a mesma coisa…
Comecei a ficar preocupada, e ainda mais preocupada com o facto de ter que voltar ao trabalho e estar sem agenda disponível para despender tempo para ir a um médico.
Depois de alguma insistência de familiares e colegas de trabalho, decidi ir às urgências.
Infelizmente, depois de horas à espera para ser atendida, fui chamada a um oftalmologista que depois de me avaliar disse:
“Menina, eu não sei o que isto é, mas é algo muito grave, tem que ser vista por uma médica especialista que temos cá, mas ela só volta de férias daqui por 15 dias, tem que marcar uma consulta com ela”.
Isto era tudo, menos aquilo que eu esperava ouvir nesse momento, tal foi o meu espanto que acabei por desmaiar por quebra de tensão. Deu-me literalmente o “fanico”.
Depois de sair do hospital decidi que não poderia esperar 15 dias e marquei consulta num outro hospital privado para o dia seguinte.
No dia seguinte cheguei à consulta super assustada. A médica calmamente me tranquilizou, disse que realmente não se conseguia perceber o que era e que parecia grave mas que iam fazer tudo para me ajudar.
E assim começou a minha aventura, exames e mais exames, uma correria dum hospital para o outro, fazer TAC´s, experimentar outros métodos e não se descobria o que se estava a passar.
Todo o hospital se reuniu para discutir o meu caso, todos os médicos queriam ver o meu olho.
Apesar de me sentir numa espécie de “freak show”, percebia que era tudo para meu bem.
Finalmente seguimos um diagnostico que até hoje não sabemos se está 100% correto.
Os sintomas que eu apresentava pareciam os sintomas duma doença rara que afeta rapazes até aos 7 anos de idade. Como sou uma rapariga e com muito mais de 7 anos foi difícil para os médicos diagnosticar. No entanto decidimos optar por tratamentos para combater essa doença rara.
Ora bem, o facto de ser uma doença rara tem uma vantagem e uma desvantagem:
Vantagem – é RARA, poucas pessoas vivem com ela.
Desvantagem – não está bem estudada, nem há métodos/resultados efetivos e seguros.
Começamos uma série de tratamentos alguns dolorosos outros não.
Todas as semanas, às vezes mais do que uma vez, lá estava eu no hospital para fazer mais qualquer coisa.
De repente também percebi que o meu tempo e a minha agenda se organizaram. Quando é preciso arranja-se tempo para tudo. Então, apesar de ser um stress conciliar a marcação dos tratamentos com a minha agenda, aprendi a ser mais tranquila e a perceber que quanto mais calma estiver, melhor se organizam as coisas.
Mas agora imaginem o que é refazer a vida apenas com a visão de um olho…
A perda de equilíbrio, de profundidade e de visão lateral que é afetada é incrível, e em alguns momentos achei que teria de deixar de fazer as coisas que mais gostava de fazer: treinar, fazer desporto radical, viajar, nadar …
Passou um ano e a única evolução que tínhamos tido, foi que num dos momentos do tratamento houve uma pequena recuperação da visão, (cerca de 10%) no entanto nada estava a melhorar substancialmente.
Finalmente, passados 1 ano e nove meses fiz a minha última cirurgia, a última opção de todas por ser a mais invasiva. O objetivo desta cirurgia não era a recuperação da visão, mas sim parar o avanço da doença que degrada o olho cada vez que avança.
A cirurgia correu bem, mas não recuperei a visão. A doença estabilizou (para já) e agora as visitas ao hospital são menos frequentes pois servem de controlo e avaliação do estado da doença.
Nunca se sabe o que vai acontecer. A qualquer momento posso piorar como posso, quase por milagre, melhorar e eventualmente recuperar a visão.
Assusta, assusta muito, mas o mais incrível no meio disto tudo é a capacidade incompreensível que nós e o nosso corpo tem de se adaptar a novas situações.
Não foram precisos muitos meses para que a minha vida se restaurasse. Voltei a fazer tudo o que fazia, voltei a ganhar o meu equilíbrio, e desenvolvi estratégias para combater a falta de visão do olho direito.
Somos muito fortes, muito mais do que aquilo que imaginamos! Não temos noção da força e da capacidade que possuímos!
O meu lema de vida é que “tudo acontece por uma razão”, a minha maior verdade.
Claro que preferia não ter passado por esta situação nem viver com esta condição, mas hoje olho para trás e vejo que sou uma pessoa mais tranquila, invisto tempo para mim, tiro férias, muitas férias, viajo muito e aproveito o melhor da vida.
Por isso, não vivas só por viver, não vivas preso à agenda, ao trabalho, não desejes que a semana passe rápido, arranja tempo, arranja tempo para ti!
O meu maior conselho: Todas as semanas faz uma coisa que gostas muito de fazer e uma vez por mês arrisca uma aventura, uma viagem, um retiro, um spa day, uma corrida, um evento, ou qualquer coisa que te faça verdadeiramente feliz.
Com amor, a.
Fotografia: Ana Formigo
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Parece -me muito bem a capacidade de adaptação. Pontos de vista conscientes e interessantes .
A vida tem sempre o lado bom !
Basta estar-mos mais atentos.
Agradeço a partilha Filipa! Existe sempre uma forma diferente de ver as coisas.